A Palestina e um vírus chamado sionismo

31/03/2020
Por: Ashjan Sadique Adi

No atual momento, temos ciência e consciência da epidemia do coronavírus, que assola o mundo, atingindo desde um lugar distante como a China até as nossas casas e a casa da vizinha, nos assustando todos os dias. Um fenômeno como poucos na história, e que nos faz lembrar a Gripe Russa (1889-1890), a Gripe Espanhola (1918-1919), a Gripe Asiática (1957-1958), a Gripe de Hong Kong (1968-1969), todas com milhões de vítimas fatais, na Espanhola estimadas em até 100 milhões.

As mídias sociais, a televisão, os jornais, não nos deixam esquecer do coronavírus, lembrado a cada reportagem, a cada vídeo. Mas hoje, no dia 30 de março, data em que, no ano de 1976, a Palestina do Rio ao Mar realizou uma grande greve geral em várias de suas cidades, desde a Galileia da cidade de Nazaré ao deserto de Al Náqab, ao sul, manifestando-se em revolta contra o roubo de terras palestinas pelas mãos do governo usurpador de Israel: um descumpridor de acordos, resoluções e toda a legalidade internacional desde 1948.

Neste momento, em que a pandemia assola a todos, o sofrimento dos palestinos e palestinas tem um plus: sofrem mais porque seguem enclausurados pelos bloqueios econômico e humanitário, que impedem a entrada de alimentos, remédios, brinquedos e até temperos, sobretudo na guerreira Faixa de Gaza. Por isso, eu gostaria de falar brevemente de um vírus: o vírus do sionismo.

Neste momento, em que a pandemia assola a todos, o sofrimento dos palestinos e palestinas tem um plus: sofrem mais porque seguem enclausurados pelos bloqueios econômico e humanitário, que impedem a entrada de alimentos, remédios, brinquedos e até temperos, sobretudo na guerreira Faixa de Gaza.

Este vírus, que gera a matança de palestinos e palestinas não por doença, mas por assassinatos, prisões, torturas, demolições e humilhações, o vírus sionista. Este vírus começou a ser produzido em 1897, quando, no I Congresso Sionista, realizado em Basiléia, Suíça, deliberaram entre a Argentina, o Sudão e a Palestina para sediarem a ideia de um estado puramente judaico, sendo esta última a escolhida para ser inoculada e tornar-se o novo Lar Nacional Judeu.

Detalhe interessante é que não consultaram os habitantes da terra Palestina a respeito da chegada dos novos “moradores”, ou melhor, os estrangeiros invasores. Sim, que invadiram e se inocularam na terra Palestina como um vírus, transmitindo por onde passava a doença de sua ocupação, travestida nas ideias de direito legítimo ou na mentirosa necessidade de segurança.

E o criador deste vírus da morte foi o pai do sionismo político moderno – Theodor Herzl (1860-1904). Judeu nascido na Hungria. Que coisa curiosa: Hungria, Europa, o que tem a ver com a Palestina? Pois é, a escolheram arbitrariamente como lar, onde já havia lares, pessoas, famílias vivendo lá a pelo menos 10 mil anos, como nos comprovam e não nos deixam mentir a cidade de Jericó, com seus 10.700 anos ininterruptamente habitados.

Herzl empreendeu esforços para obter o apoio das elites judaicas e governantes europeus ao projeto sionista. Segundo o historiador israelense Avi Shlaim, em A muralha de Ferro, seu pressuposto “não declarado” e de seus sucessores era que o movimento alcançaria o seu objetivo “não através de um entendimento com os palestinos locais, mas por meio de uma aliança com a grande potência dominante do momento”. Esse parceiro seria a Grã-Bretanha, como nos fala a querida amiga de luta Soraya Misleh em seu livro Al Nakba (Sundermann, 2017).

A Nakba em 1948 foi a grande epidemia do vírus sionista, que se alastrou na Palestina e atingiu nossos corpos, nossa pele, nossa etnia, matou dezenas de milhares, expulsou centenas de milhares, desalojou ou deslocou outros muitos milhares.

Nakba significa “catástrofe” no idioma árabe, uma catástrofe que atravessa milhões de palestinos/as, imigrantes, refugiados/as, ocupados/as. Que atravessa minha história, a história de meus pais, de meus avós, primos e primas, alguns já presos pelo vírus, a história de minha família e, de alguma forma, a história de todos/as aqueles/as que lutam ou que se sensibilizam pela Libertação da Palestina.

A Nakba em 1948 foi a grande epidemia do vírus sionista, que se alastrou na Palestina e atingiu nossos corpos, nossa pele, nossa etnia, matou dezenas de milhares, expulsou centenas de milhares, desalojou ou deslocou outros muitos milhares. Apenas não foi e nunca será capaz de desalojar nossa luta e perseverança: a estas o vírus sionista jamais contaminará, pois são elas o nosso antídoto contra as tentativas funestas e infames de nos infectar e matar a exatos 72 anos. Vocês não conseguirão. Nós somos a insônia dos soldados assassinos de Palestinos. Vocês não dormirão, pois “nascem milhares dos nossos cada vez que um nosso cai”, como nos diz Bia Ferreira sobre as pessoas negras e sua luta.

Para finalizar, a epidemia do vírus sionista continua cotidianamente, E JÁ SE ALASTRAVA BEM ANTES DO CORONAVÍRUS (não podemos nos esquecer disso) nas suas violências desumanas e violações de direitos mais que humanos, nas prisões, nas ocupações, no desrespeito cotidiano a mulheres, crianças e anciãos. Mas resistimos, pois, o Palestino é, acima de tudo, um forte. E parafraseando o grande poeta da resistência palestina Mahmoud Darwish, se há um mal do qual não temos cura, este mal se chama Esperança. Até a Vitória!

Ashjan Sadique Adi é Secretária de Mulheres da Federação Árabe Palestina do Brasil (FEPAL).