Por um Novembro democrático e libertário para brasileiros e palestinos

13/11/2020
Por: Ualid Rabah

Este mês é um dos mais emblemáticos para a Palestina e seu povo, talvez para o mundo, dadas as repercussões globais de tudo que diga respeito à Questão Palestina. E é também o mês em que nós consagraremos, nas urnas, a pujante democracia brasileira nestas eleições municipais, tanto em primeiro quanto em segundo turno.

Para a Palestina as datas do mês de novembro começam a criar repercussões no dia 2, quando o então chanceler britânico Arthur Balfour promete aos dirigentes euro-judeus sionistas um “Lar Nacional Judeu” na Palestina. Era o ano de 1917 e ali começava, com a chamada Declaração Balfour, a tragédia palestina, que se arrasta até os dias atuais.

Anteontem, dia 11, lembramos mais uma vez do martírio do grande líder palestino Yasser Arafat, considerado à quase unanimidade como o maior líder palestino de todos os tempos e um dos maiores de sua geração. Para muitos historiadores, Arafat foi um dos mais importantes líderes do século passado na luta contra o colonialismo, ao lado de Mandela e Ghandi, de Gamal Nasser e Khomeini, de Ho Chi Min e Mao Tse Tung e inumeráveis outros.

Arafat morreu em 11 de novembro de 2004, hospital militar Percy, nas imediações de Paris.

Seu sepultamento, em 13 de novembro, acompanhado por verdadeira multidão, foi em Ramallah, sede administrativa da Palestina, porque o regime israelense de ocupação impediu que Arafat fosse sepultado em sua cidade natal, Jerusalém. A ocupação israelense impediu, também, que outras centenas de milhares de palestinos chegassem a Ramallah para o último adeus àquele que foi seu líder inconteste e depositário de todas as suas esperanças.

Arafat foi tão importante para os palestinos e para o mundo que seu mausoléu e o museu anexo a ele, dedicado à história do líder palestino, virou ponto de verdadeira romaria de palestinos e de não palestinos de todas as partes do mundo. Não há quem vá à Palestina que não faça um registro fotográfico junto do túmulo de Arafat. Neste particular vale salientar: quem faz registro fotográfico junto de alguma sepultura de líder israelense? Não à toa, ninguém.

Este mês é um dos mais emblemáticos para a Palestina e seu povo, talvez para o mundo, dadas as repercussões globais de tudo que diga respeito à Questão Palestina. E é também o mês em que nós consagraremos, nas urnas, a pujante democracia brasileira nestas eleições municipais, tanto em primeiro quanto em segundo turno.

Daí as reais estaturas política, moral, intelectual, ética e histórica de Arafat diante da de seus algozes israelenses, que, conforme confirmaram análises, o envenenaram anos a fio com polônio 210, substância radioativa mortal.

A importância de Arafat está em ter sido capaz de organizar as lutas armada e política dos palestinos sem praticamente nenhum apoio, seja do chamado ocidente, seja da antiga URSS, seja de parte do chamado mundo árabe, ressalvando sempre que não faltaram dentre as nações árabes as que fortemente apoiaram a luta palestina e assim seguem. E mais: ter se tornado referência para todos os movimentos de libertação nacional, do Vietnã à África do Sul sob apartheid, da América Central ao Iêmen.

Em 1959, quando fundou, a partir do Kuwait, onde então vivia, o Al-Fatah, ninguém ousava imaginar que os palestinos seriam capazes de construir um poderoso grupo guerrilheiro, os fedayns, um verdadeiro exército não estatal, depois tornada a força da OLP, especialmente a partir de 1969, quando passa a comandá-la.

Arafat não foi apenas um líder guerrilheiro fora do comum. Ele foi também um líder político de envergadura mundial. Como escreveu o jornalista brasileiro Clóvis Rossi, Arafat era um dos poucos que fazia com que os homens mais ricos e poderosos do mundo se acotovelassem em Davos, Suíça, para vê-lo e ouvi-lo. Arafat era, segundo Rossi, um dos últimos homens que não se podia pintar de cinza.

Já hoje, 13 de novembro, além de ser o dia em que Arafat fora sepultado, lembramos de quando ele, nesta data, porém no ano de 1974, foi o primeiro líder não estatal ou de governo a falar à Assembleia Geral das Nações Unidas. Na ocasião Arafat disse ao mundo que trazia consigo, numa das mãos, uma arma com a qual combatia pela liberdade, e na outra um ramo de oliveira, símbolo da paz que buscava para a Palestina, conclamando a comunidade internacional para que não o deixasse cair. Antes dele, somente o papa havia falado na ONU na condição de chefe de estado (o Vaticano) não-membro (apenas observador) da organização.

A OLP havia sido reconhecida, em 14 de outubro de 1974,, como a única e legítima representante do povo palestino, e a 22 de novembro do mesmo ano tornava-se membro observador não-estatal da ONU.

Novembro começou como um mês trágico para a Palestina, mas com o passar dos anos, graças às lutas de seus povo e líderes, tanto no campo de batalha quanto nos palcos da diplomacia, este mês também acumulou muitas de suas principais conquistas.

E no exato dia do primeiro turno de nossas eleições municipais deste ano, neste 15 de novembro, que também é o Dia da Proclamação da República, a OLP proclamou, no ano de 1988, em Argel, capital da Argélia, em uma sessão extraordinária no exílio do Conselho Nacional Palestino, um Estado Palestino com capital em Jerusalém e aceitava as Resoluções 181 e 242 da ONU. A Declaração de Independência foi redigida por Mahmoud Darwish, o poeta nacional palestino.

E a 29 de novembro, que neste ano de pandemia coroará a democracia brasileira com os segundos turnos destas eleições municipais, porém no longínquo ano de 1947, a ONU recomendava, por meio da Resolução 181 de sua Assembleia Geral, a partilha da Palestina, ato do qual resultou, a 14 de maio de 1948, a autoproclamação de Israel como estado e a limpeza étnica na Palestina que a isto se seguiu, promovida pelos estrangeiros euro-judeus recém-chegados às terras palestinas, quase todos portadores de uma ideologia supremacista e colonialista, o sionismo, por não-poucos considerada uma forma de racismo e apartheid, características cada vez mais nítidas à Comunidade Internacional, que antes preferiu fechar os olhos a esta realidade.

E foi também em 29 de novembro, porém em 2012, que a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou uma moção que alterava a situação de “entidade” da Palestina para “Estado não-membro observador”. A Resolução 67/19, que teve 138 votos favoráveis e apenas 9 votos contrários (Israel e EUA incluídos), fez com que a ONU e todos os seus organismos passassem a adotar, em seus documentos, a designação “Estado da Palestina”.

Novembro começou como um mês trágico para a Palestina, mas com o passar dos anos, graças às lutas de seus povo e líderes, tanto no campo de batalha quanto nos palcos da diplomacia, este mês também acumulou muitas de suas principais conquistas.

Esperamos que neste novembro as urnas nos brindem com um Brasil mais democrático, mais livre, soberano, desenvolvido e próspero, liberto da intolerância, do ódio e da xenofobia, valores que nos devem nortear quanto estivermos diante do sufrágio, seja neste domingo, em primeiro turno, seja dia 29, quando retornaremos ao templo da democracia, às sagradas urnas.

E que terminemos este mês com um mundo mais disposto a dar fim ao sofrimento do povo palestino, que já dura mais de 72 anos.

Ualid Rabah Ualid Rabah é presidente da FEPAL – Federação Árabe Palestina do Brasil