Anatomia de um sequestro por invasores de terras
Emboscado, arrastado até um posto avançado no topo de uma colina, espancado até perder a consciência: o adolescente palestino Owais Hammam relata sua brutal tortura por colonos e soldados israelenses.
Owais Hammam, de 18 anos, foi sequestrado e brutalmente agredido por colonos israelenses com a ajuda do exército israelense, no Complexo Médico da Palestina, em Ramallah, em 6 de dezembro de 2025. (Foto: Faiz Abu Rmeleh/Activestills)
Por Faiz Abu Rmeleh*
Em uma cama branca de hospital no Complexo Médico da Palestina, em Ramallah, o jovem Owais Hammam, de 18 anos, luta para recuperar o fôlego em respirações curtas e superficiais. Seu rosto fala antes mesmo de ele abrir a boca: arranhões profundos, hematomas azul-escuros, inchaço do pescoço até as pernas. Com grande esforço, ele relata lentamente o que aconteceu na tarde do dia 3 de dezembro, quando foi sequestrado e brutalmente torturado por um grupo de colonos israelenses perto de sua aldeia, Kharbatha Bani Harith, a noroeste de Ramallah.
Hammam havia saído para uma breve caminhada perto de uma fonte que conhece bem, acreditando estar longe de qualquer perigo. Enquanto parou para rezar, um grupo de colonos de repente o cercou, como se o estivesse observando desde o momento em que chegou. Antes que pudesse compreender o que estava acontecendo, golpes começaram a chover sobre seu corpo. Ele rapidamente perdeu a capacidade de ficar em pé. Momentos depois, sentiu-se sendo arrastado colina acima em direção a Sde Ephraim — um posto avançado de colonos que Israel legalizou em 2024.
Hammam recorda aquelas horas como se estivessem acontecendo novamente: as mãos amarradas firmemente atrás do corpo, coronhadas atingindo todas as partes, pedras lançadas contra ele enquanto jazia no chão, insultos e xingamentos que não cessavam. Alguns dos agressores usavam roupas civis, outros uniformes militares. Um deles carregou a arma ao lado do ouvido de Hammam e disse que ele não sairia vivo dali.
Hammam logo perdeu a consciência por causa da dor e, quando acordou, encontrou-se sob custódia de soldados israelenses, que continuaram a espancá-lo até a manhã seguinte. Ele também foi interrogado por um oficial do Shin Bet, o serviço de segurança interna de Israel, e lhe foi negado até mesmo um gole de água, apesar de estar em jejum.
Owais Hammam, de 18 anos, foi sequestrado e brutalmente agredido por colonos israelenses com a ajuda do exército israelense, no Complexo Médico da Palestina, em Ramallah, em 6 de dezembro de 2025. (Faiz Abu Rmeleh/Activestills)
O pai de Hammam está sentado ao lado dele na cama do hospital, relatando a angústia de esperar o retorno do filho após seu desaparecimento. Somente nas primeiras horas da manhã seguinte a família recebeu uma ligação do Shin Bet informando que colonos haviam capturado Hammam e o entregado ao Exército.
Quando finalmente foi levado ao hospital, os médicos disseram que ele precisava de monitoramento rigoroso e de fluidos intravenosos contínuos para estabilizar seu estado, devido à gravidade das agressões. Ainda assim, disse o pai, o moral de Owais permaneceu elevado, como se a própria sobrevivência tivesse se tornado um ato de resistência.
“Meu filho voltou da morte”, acrescentou. “Sinto como se ele tivesse nascido de novo.”
O ataque a Owais não é um caso isolado. Ele ocorre em meio a uma escalada sem precedentes do terrorismo de colonos em toda a Cisjordânia, onde agressões quase diárias — frequentemente realizadas com o apoio do Exército israelense — equivalem a um esforço sistemático para remodelar a demografia da região em favor do assentamento judaico. Desde o início da guerra em Gaza, os palestinos na Cisjordânia vivem em um estado constante de expectativa: aguardando o próximo ataque, a próxima ameaça, a próxima vítima.
Na Área C, que está sob controle direto do Exército israelense, os palestinos enfrentam há anos a pressão organizada de colonos apoiados pelo Estado, que expulsaram dezenas de comunidades de suas terras e estabeleceram 40 novos postos avançados apenas nos últimos seis meses. Agora, porém, eles perseguem palestinos não apenas na Área C, mas também na Área B e até na Área A, que estão nominalmente sob jurisdição parcial e total da Autoridade Palestina. Muitos moradores falam de ataques que passaram a atingir pessoas que antes não tinham contato direto com colonos.
Segundo a Comissão de Resistência à Colonização e ao Muro da Autoridade Palestina, somente em novembro houve mais de 2.000 ataques contra palestinos na Cisjordânia, incluindo mais de 600 realizados por milícias de colonos. Altas autoridades israelenses alertaram recentemente que, com o crescimento do poder e da impunidade de grupos extremistas de colonos, o Estado está perdendo cada vez mais o controle da situação no terreno.
O Exército israelense afirmou estar investigando forças da reserva por seu papel no ataque contra Hammam, e uma fonte militar disse ao The Times of Israel que seus ferimentos eram “perturbadores”. O Exército acrescentou que as forças chegaram após relatos de um palestino “expressando a intenção de realizar um ataque” e alegou que alguns de seus ferimentos foram resultado de quedas sobre pedras.
Do lado de fora do quarto de Owais no hospital, uma funcionária da limpeza atravessa o corredor, repetindo uma frase que parece capturar tudo: “Sobreviver aqui se tornou um milagre diário.”
* Faiz Abu Rmeleh é fotojornalista da Cidade Velha de Jerusalém. Ele é membro do coletivo Activestills e trabalhou para diversos jornais locais e internacionais. Reportagem publicada no +972 Magazine em 10/12/2025.
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