Ele foi preso por postar nas redes sociais. Então soldados israelenses o estupraram com um cão

Dois reféns palestinos relatam à BBC como brutalmente estuprados nas masmorras israelenses

22/12/2025

Foto de arquivo da prisão de Megido, onde Sami al-Saei afirma ter sido detido. (Foto: Getty Images)

Por Jon Donnison*

Dois homens palestinos disseram à BBC que vivenciaram pessoalmente o tipo de espancamentos e abusos sexuais destacados em relatórios recentes sobre o tratamento de prisioneiros em detenções israelenses.

O Comitê das Nações Unidas contra a Tortura afirmou no mês passado estar profundamente preocupado com relatos que indicam “uma política estatal de facto de tortura organizada e generalizada e maus-tratos” de detentos palestinos em prisões israelenses. O comitê disse que as alegações se “intensificaram gravemente” após os ataques liderados pelo Hamas contra Israel em 7 de outubro de 2023.

Outros relatórios de organizações israelenses e palestinas de direitos humanos detalharam o que classificam como abuso “sistemático”.

Israel negou todas as alegações, mas grupos de direitos humanos afirmam que a fúria no país diante dos ataques de 7 de outubro e do tratamento de reféns israelenses em Gaza criou uma cultura de impunidade dentro do sistema prisional, especialmente em relação a detentos que expressaram apoio ao Hamas e a seus ataques.

No ano passado, imagens vazadas de câmeras de segurança (CCTV) de dentro de uma prisão militar israelense mostraram um homem palestino de Gaza supostamente sendo abusado sexualmente por agentes penitenciários. O episódio levou a uma renúncia e a recriminações no topo do establishment militar e político de Israel.

Sami al-Saei, 46 anos, hoje trabalha em uma loja de móveis, mas anteriormente atuava como jornalista freelancer na cidade de Tulkarm, no norte da Cisjordânia ocupada.

Ele foi preso por soldados israelenses em janeiro de 2024 após trabalhar com repórteres para organizar entrevistas com membros do Hamas e de outros grupos armados.

Ficou detido sem acusação formal por 16 meses, sob um sistema israelense controverso conhecido como detenção administrativa, antes de ser libertado neste verão.

Enquanto estava detido na prisão de Megiddo, no norte de Israel, disse que os guardas o despiram parcialmente e o estupraram com um cassetete por volta de 13 de março de 2024.

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Ele afirmou ter decidido falar à BBC sobre suas alegações de abuso sexual, apesar do risco de ser ostracizado na sociedade palestina, frequentemente conservadora, da Cisjordânia.

“Havia cinco ou seis deles”, disse.

“Eles estavam rindo e se divertindo. O guarda me perguntou: ‘Você está gostando disso? Queremos brincar com você e trazer sua esposa, sua irmã, sua mãe e amigos para cá também’”, continuou o sr. al-Saei.

“Eu esperava morrer e acabar com aquilo, pois a dor não foi causada apenas pelo estupro, mas também pelas surras severas e dolorosas.”

Ele disse que a agressão durou cerca de 15 a 20 minutos, período durante o qual os guardas também apertaram seus genitais, causando dor extrema.

Relatou que os espancamentos aconteciam quase diariamente, mas que foi abusado sexualmente apenas uma vez.

A BBC solicitou uma resposta do Serviço Prisional de Israel (IPS) às alegações do sr. al-Saei. O órgão enviou uma nota afirmando: “Operamos em plena conformidade com a lei, garantindo a segurança, o bem-estar e os direitos de todos os detentos sob nossa custódia.”

“Não temos conhecimento das alegações descritas e, até onde sabemos, tais incidentes não ocorreram sob responsabilidade do IPS.”

Sami al-Saei alega ter sido abusado sexualmente por guardas prisionais enquanto estava detido sem acusação formal. (Foto: BBC)

Também perguntamos ao IPS se havia sido aberta alguma investigação sobre a suposta agressão sexual e se existiam registros médicos. O órgão não comentou.

Alegações de abuso contra palestinos em prisões israelenses vêm sendo feitas há décadas, mas um caso recente abalou o establishment do país e aprofundou uma crescente divisão na sociedade israelense sobre o tratamento de prisioneiros e detentos acusados de apoiar o Hamas.

Em agosto de 2024, imagens vazadas de CCTV de dentro da prisão militar de Sde Teiman, no sul de Israel, mostraram um detento palestino de Gaza supostamente sendo abusado com um objeto pontiagudo por soldados, deixando o homem com o reto perfurado. A agressão teria ocorrido em julho de 2024.

Cinco soldados reservistas israelenses foram acusados de abuso agravado e de causar lesões corporais graves ao detento.

No mês passado, eles convocaram uma coletiva de imprensa na televisão israelense, quatro deles aparecendo com balaclavas pretas para ocultar suas identidades.

Em entrevista ao Channel 14 News, um quinto soldado retirou a máscara para mostrar o rosto, dizendo não ter nada a esconder.

Todos os cinco negaram as acusações.

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Os reservistas realizaram a coletiva depois que se tornou público que as imagens de CCTV haviam sido vazadas pela principal advogada das Forças Armadas israelenses, a Procuradora-Geral Militar, major-general Yifat Tomer-Yerushalmi.

Ela renunciou em outubro, afirmando assumir total responsabilidade pelo vazamento. Explicou que queria “contrapor a propaganda falsa contra as autoridades de aplicação da lei do exército” — referência a alegações de alguns políticos de direita de que as acusações eram fabricadas.

Apoiadores da extrema direita realizaram protestos em apoio aos cinco reservistas acusados do lado de fora da prisão de Sde Teiman.

Em julho, antes de sua renúncia, durante uma acalorada audiência em comissão do parlamento israelense, Hanoch Milwidsky, político do partido direitista Likud do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, foi confrontado sobre se estuprar um detento seria aceitável.

“Cale a boca, cale a boca”, gritou. “Sim, tudo é legítimo se eles forem Nukhba [combatentes de elite do Hamas que participaram dos ataques de 7 de outubro]. Tudo.”

Uma pesquisa de opinião recente do amplamente respeitado Instituto da Democracia de Israel indicou que a maioria do público israelense se opõe à investigação de soldados quando são suspeitos de abusar de palestinos de Gaza.

Ahmed, que não é seu nome verdadeiro, vive na Cisjordânia com sua esposa e 11 filhos.

Ele foi preso por soldados em janeiro de 2024 e considerado culpado de incitação ao terrorismo, após fazer publicações nas redes sociais elogiando os ataques liderados pelo Hamas em 7 de outubro.

Ele foi condenado a um ano de prisão e multado em 3.000 shekels (US$ 935; £700).

Ele alega ter sofrido grave abuso sexual enquanto estava detido por Israel.

“Os guardas da prisão, três deles, me levaram a um banheiro e me despiram completamente antes de me forçarem ao chão”, disse Ahmed em entrevista em sua casa.

“Eles colocaram minha cabeça dentro da privada e um homem enorme, talvez de 150 kg, pisou na minha cabeça, de modo que eu fiquei curvado. Em seguida, ouvi a voz de alguém falando com o cão da prisão. O cachorro se chamava Messi, como o jogador de futebol.”

Ele então detalhou como o cão foi usado para humilhá-lo sexualmente. Relatou que suas calças e roupa íntima foram retiradas e o cão montou em suas costas.

“Eu podia sentir sua respiração… então ele pulou sobre mim… comecei a gritar. Quanto mais eu gritava, mais eles me batiam, até que quase perdi a consciência.”

Durante o período de detenção, Ahmed também afirmou que os guardas o espancavam regularmente, inclusive nos genitais.

Disse que foi libertado 12 dias após o abuso sexual, depois de cumprir integralmente sua pena.

Perguntamos a Ahmed se havia documentos médicos relacionados às suas alegações, mas ele disse não ter nenhum.

“Ahmed” alega ter sofrido abusos em uma prisão israelense após ser considerado culpado de incitação ao terrorismo. (Foto: BBC)

Entramos em contato com o IPS para solicitar uma resposta às alegações de Ahmed e saber se havia sido aberta uma investigação sobre o suposto abuso, mas não recebemos resposta.

Há mais de 9.000 detentos palestinos por motivos de segurança mantidos em prisões israelenses, quase o dobro do número existente antes dos ataques de 7 de outubro. Muitos nunca foram formalmente acusados.

O relatório recente do Comitê da ONU contra a Tortura condenou inequivocamente os ataques de 7 de outubro e também expressou profunda preocupação com a resposta de Israel e a enorme perda de vidas humanas em Gaza.

Há ainda denúncias de abuso em prisões administradas pela Autoridade Palestina (AP), que governa partes da Cisjordânia fora do controle israelense e é rival político e militar do Hamas.

A BBC falou com um ex-detento que disse que agentes de segurança da AP o espancaram e usaram choques elétricos contra ele.

A BBC entrou em contato com a AP para comentar, mas não recebeu resposta. Anteriormente, a Autoridade havia negado alegações de abuso sistemático.

Em um relatório apresentado em outubro ao Comitê da ONU contra a Tortura, cinco organizações israelenses de direitos humanos afirmaram haver “uma escalada dramática de tortura e de tratamento cruel, desumano e degradante em todas as instalações de detenção, realizada com quase total impunidade e implementada como política de Estado contra os palestinos”.

Adalah, o Comitê Público Contra a Tortura em Israel, Parents Against Child Detention, HaMoked e Physicians for Human Rights–Israel apresentaram evidências que, segundo disseram, mostram que Israel “desmantelou salvaguardas existentes e agora emprega a tortura ao longo de todo o processo de detenção — da prisão ao encarceramento — visando palestinos sob ocupação e cidadãos palestinos, com autoridades de alto escalão sancionando esses abusos enquanto mecanismos judiciais e administrativos falham em intervir”.

O relatório afirmou que tais práticas resultaram em um aumento das mortes de palestinos sob custódia, com pelo menos 94 mortes documentadas em custódia israelense entre o início da guerra em Gaza e o fim de agosto de 2025.

O embaixador de Israel na ONU em Genebra rejeitou as alegações apresentadas ao Comitê da ONU contra a Tortura como “desinformação”.

Daniel Meron disse ao painel de especialistas no mês passado que Israel estava “comprometido em cumprir suas obrigações de acordo com nossos valores e princípios morais, mesmo diante dos desafios impostos por uma organização terrorista”.

Ele afirmou que as agências israelenses relevantes cumprem integralmente a proibição da tortura e que Israel rejeita as alegações de uso sistemático de violência sexual e baseada em gênero.

* Direto da Cisjordânia ocupada. Donnison tem larga experiência na cobertura do Oriente Médio, Gaza e da Questão Palestina, com envios frequentes pela BBC. Reportagem publicada na BBC em 20/12/2025.

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