Nova investigação de “israel” não encontra provas de supostos crimes sexuais do Hamas
Grandes veículos de mídia promoveram a ideia de violência sexual sistemática em momentos oportunos para justificar o genocídio em curso de "israel" em Gaza
Benjamin Netanyahu aparece na cúpula DealBook do New York Times em 30 de novembro de 2022, na cidade de Nova York. Foto de Michael M. Santiago/Getty Images.
Por Ryan Grim*
O Projeto Dinah precisou criar um novo padrão de evidência para continuar sustentando alegações de violência sexual cometida pelo Hamas em 7 de outubro de 2023.
Neste mês, o Projeto Dinah — uma organização israelense — publicou um novo relatório amplamente descrito pela mídia ocidental como uma análise aprofundada da violência sexual cometida por grupos militantes palestinos em 7 de outubro de 2023. No entanto, o documento contém poucas evidências novas e basicamente compila relatos já existentes — muitos dos quais foram desmentidos ou colocados em dúvida. Em vez de apresentar novas provas, o relatório argumenta que menos provas deveriam ser exigidas: passa a maior parte de suas 80 páginas desenvolvendo um argumento jurídico a favor de um padrão probatório mais baixo para processar o Hamas por crimes de guerra, com base no suposto uso sistemático da violência sexual como arma de guerra.
Segundo o relatório, promotores não deveriam depender dos tipos de provas normalmente exigidas em processos — como testemunhos de vítimas ou testemunhas, laudos forenses e similares —, mas sim de “provas circunstanciais” e deduções gerais. Para estabelecer um padrão de violência sexual sistemática, bastaria identificar casos isolados e interpretar neles um caráter sistêmico. Para fechar o ciclo, esses casos individuais nem precisam atender aos padrões tradicionais de um processo judicial.
Grandes veículos de mídia, especialmente o New York Times, promoveram a ideia de violência sexual sistemática em momentos oportunos para justificar o genocídio em curso de Israel em Gaza. As primeiras manchetes sensacionalistas surgiram no final de 2023, quando Israel buscava retomar sua ofensiva após uma breve trégua. A mais recente tentativa de ressuscitar essa narrativa segue o mesmo padrão — e é ainda mais abertamente política, com o relatório dedicando mais espaço a argumentos jurídicos para enfraquecer o direito internacional do que ao bem-estar das mulheres.
Inscreva-se em nosso canal no Youtube!
Ruth Halperin-Kaddari, autora principal do relatório e jurista israelense, afirmou em uma coletiva de imprensa no dia 9 de julho que o objetivo do relatório era obter apoio de organizações externas para pressionar as Nações Unidas. “A esperança é… corrigir o registro histórico e fazer com que seja endossado por tantas organizações quanto possível, e a partir disso, continuar também no plano político internacional”, disse Halperin-Kaddari. “Esperamos que o Secretário-Geral realmente siga adiante e inclua o Hamas na lista negra.”
Halperin-Kaddari foi bem-sucedida em moldar a narrativa global sobre a violência sexual em 7 de outubro. Logo após o ataque, ela recrutou sua ex-colega Pramila Patten — atual Representante Especial do Secretário-Geral da ONU sobre Violência Sexual em Conflitos e subsecretária-geral da ONU — para uma visita ao sul de Israel, com o objetivo de produzir um relatório sobre violência sexual. Esse relatório é frequentemente citado como prova de que a ONU validou a ideia de um “padrão” de violência sexual. No entanto, o documento não foi conclusivo — sequer possuía um mandato investigativo —, mas ainda assim desmentiu muitas das alegações sensacionalistas feitas publicamente na época. Essas alegações agora reaparecem na nova versão do Projeto Dinah, mesmo já tendo sido refutadas.
Os autores do Projeto Dinah sabiam desde o início que a falta de provas e testemunhas apresentaria desafios, e por isso começaram a desenvolver cedo uma nova estrutura para atribuir culpa ao Hamas. “Nosso objetivo é propor um esquema para deduzir premeditação a partir de evidências circunstanciais, incluindo comparações com formas de violência típicas de CRSV [violência sexual relacionada a conflitos]”, afirma uma declaração de missão inicial do projeto. Esse novo esquema probatório é detalhado no novo relatório.
A ONU, no entanto, afirmou várias vezes que não possui evidências de abuso sexual sistemático por parte do Hamas ou de qualquer outro grupo militante em 7 de outubro de 2023. Uma alta funcionária das Nações Unidas divulgou uma declaração na semana passada que contradiz diretamente o novo relatório israelense. Reem Alsalem, Relatora Especial da ONU sobre violência contra mulheres e meninas, afirmou esta semana que, embora a ONU não tenha encontrado violência sexual sistemática:
“Segundo entendo, nem a Comissão nem qualquer outro mecanismo independente de direitos humanos estabeleceram que houve violência sexual ou baseada em gênero contra israelenses em ou desde 7 de outubro como ferramenta sistemática de guerra ou genocídio”, escreveu Alsalem, segundo a NBC News.
A exigência por um padrão probatório mais baixo surge apesar de afirmações anteriores de Halperin-Kaddari — repetidas sem crítica pela imprensa ocidental — de que Israel teria reunido vasto material forense e testemunhos documentando os abusos. Reportou o The Guardian em janeiro de 2024:
A principal unidade de investigação da polícia de Israel, Lahav 433, ainda analisa 50 mil itens de evidência visual e 1.500 testemunhos, e afirma que não consegue determinar quantas mulheres e meninas sofreram violência baseada em gênero.
Ao cruzar testemunhos dados à polícia, entrevistas publicadas com testemunhas e imagens feitas por sobreviventes e socorristas, o Guardian identificou ao menos seis casos de agressão sexual com múltiplas evidências corroborativas. Duas das vítimas, assassinadas, tinham menos de 18 anos.
Segundo a própria Halperin-Kaddari, ao menos sete mulheres assassinadas teriam sido estupradas durante o ataque, com base em sua análise das provas. O New York Times e a NBC identificaram mais de 30 mulheres e meninas assassinadas com sinais de abuso, como genitais sangrando e ausência de roupas. Segundo o Ministério do Bem-Estar israelense, cinco mulheres e um homem procuraram ajuda por abuso sexual nos últimos meses.
Nenhum dos sete casos citados por Halperin-Kaddari foi comprovado; nenhum caso verificado emergiu do suposto conjunto de 50 mil imagens e 1.500 testemunhos. Em vez disso, casos alegadamente baseados em fotos foram retirados quando as imagens foram examinadas por equipes da ONU. O relatório do Projeto Dinah argumenta que a abordagem tradicional para processar violência sexual precisa ser adaptada no caso de 7 de outubro. O relatório especula que algumas vítimas podem ter sido assassinadas após os abusos, mas a ausência de provas forenses leva os autores a defender que “evidências circunstanciais” devem ser suficientes para condenar.
“É importante enfatizar que não estamos falando aqui da identificação visual de autores específicos. Estas testemunhas estabelecem diretamente a ocorrência de violência sexual durante o ataque. Segundo o modelo que propomos de responsabilidade criminal, a responsabilidade daqueles que participaram do ataque em massa é entendida como conjunta, e por isso não é necessário provar uma ligação direta entre um autor específico e um ato ou vítima específica de violência sexual.” [ênfase no original]
O dano, argumentam, é coletivo — e portanto a responsabilidade também deve ser coletiva.
Embora se esforcem para afirmar que há provas suficientes para qualificar a violência sexual como “sistemática”, mesmo com o repúdio da ONU e de outros, também argumentam que mesmo um único ato isolado de violência sexual seria um crime de guerra, pois o “ataque geral” foi “generalizado ou sistemático”:
“Portanto, do ponto de vista estritamente jurídico, conforme a definição do Artigo 7(1)(g) do Estatuto de Roma, mesmo um único ato de violência sexual, quando perpetrado ‘como parte de um ataque generalizado ou sistemático contra qualquer população civil, com conhecimento do ataque’, pode constituir um crime contra a humanidade. Importa destacar que, nesta definição, o elemento ‘generalizado ou sistemático’ refere-se à natureza do ataque como um todo, e não necessariamente aos atos de violência sexual nele cometidos.” [ênfase adicionada]
Também não parece importar que tais padrões não tenham sido exigidos em outros conflitos violentos. “Abordagens tradicionais para processar violência sexual dependem fortemente de testemunhos diretos de vítimas, frequentemente indisponíveis em contextos de conflito”, afirma o relatório. No entanto, isso é simplesmente falso. Quer tenha ocorrido no Sudão, em Ruanda, em Mianmar ou em centros de detenção israelenses, investigadores conseguem sim encontrar vítimas diretas quando a violência sexual é sistemática.
Em um gesto bastante incomum, o relatório do Projeto Dinah agora está hospedado no site da ONU entre seus próprios relatórios sobre violência sexual e conflitos globais. O site Drop Site News questionou Patten sobre por que estava hospedando o relatório, mas ela não respondeu.
Segundo os autores, se a ONU adotar os argumentos do relatório, isso terá “implicações concretas”, como a aplicação da Resolução 1960 da ONU e a inclusão do Hamas em uma lista negra da ONU de entidades que usam a violência sexual como arma de guerra. Outro objetivo declarado é “impor sanções direcionadas”.
“É preciso lembrar que a ONU até hoje não designou o Hamas como organização terrorista”, disse Halperin-Kaddari ao Ynet. “Isso obviamente é por razões políticas. … Colocar o Hamas na lista negra seria um passo para finalmente corrigir essa situação totalmente inaceitável, e encorajaria mais países a sancionar o Hamas. Colocar o Hamas na lista negra finalmente os exporia como estupradores, e não como combatentes da liberdade.”
A relatora da ONU Reem Alsalem observou que Israel impediu qualquer investigação oficial. A comissão da ONU que investiga possíveis casos de violência sexual “também não conseguiu verificar de forma independente alegações específicas de violência sexual e de gênero devido à obstrução israelense”, disse ela.
A missão de apuração de fatos da ONU liderada por Patten — valorizada pelo Projeto Dinah — em vários momentos contradiz diretamente os argumentos do próprio Projeto Dinah:
“A equipe da missão concluiu que havia motivos razoáveis para acreditar que violência sexual relacionada ao conflito ocorreu durante os ataques de 7 de outubro em várias localidades na periferia de Gaza, incluindo estupros e estupros coletivos em ao menos três locais, e que há provas claras e convincentes de que reféns em Gaza foram submetidos a agressões sexuais que provavelmente ainda estavam em curso.”
A Representante Especial do Secretário-Geral [Patten] esclareceu que a equipe da missão não pôde determinar se a violência sexual foi usada como tática de guerra ou de forma generalizada e/ou sistemática, devido ao tempo limitado disponível e porque essa determinação exigiria uma investigação completa e abrangente.
No entanto, o relatório contém conclusões suficientes para estabelecer o caráter sistemático da violência sexual. Além disso, fornece informações suficientes para determinar que os atos de violência sexual cometidos pelo Hamas em 7 de outubro constituem crimes contra a humanidade. [ênfase adicionada]
A tentativa de flexibilizar os padrões probatórios nem foi necessária para alguns veículos de imprensa. A NBC News, em sua cobertura do Projeto Dinah, afirmou que o relatório inclui “testemunho de uma sobrevivente de estupro no festival Nova”. No entanto, o relatório não contém esse testemunho; apenas afirma que os investigadores falaram com uma vítima de tentativa de estupro. A NBC News publicou uma correção após ser contatada pelo Drop Site.
* Reportagem publicada no Drop Site News em 21/07/2025.
Notícias em destaque
Hamas desafia “israel” a permitir investigação independente sobre as acusações de crimes cometidos no 7 de outubro
Esta semana, o Movimento de Resistência Islâmica (Hamas) publicou um [...]
LER MATÉRIAO carpinteiro de Gaza que foi submetido às piores crueldades de “israel”
Por Lamis Alastal* Em outubro de 2023, Samir Ewida, um carpinteiro de Beit [...]
LER MATÉRIAO Natal não é uma história ocidental – é uma história palestina
Por Rev. Dr. Munther Isaac* Todos os meses de dezembro, grande parte do [...]
LER MATÉRIAExpansão ilegal de assentamentos: como “israel” está redesenhando a Cisjordânia ocupada
Por Yashraj Sharma* O gabinete de segurança israelense aprovou 19 novos [...]
LER MATÉRIAIndústria de armas israelense se vangloria após os “testes em laboratório” de Gaza
Por Ryan Grim* Em uma recente conferência de tecnologia militar em Tel [...]
LER MATÉRIAEle foi preso por postar nas redes sociais. Então soldados israelenses o estupraram com um cão
Por Jon Donnison* Dois homens palestinos disseram à BBC que vivenciaram [...]
LER MATÉRIA